segunda-feira, janeiro 24, 2011

Presidenciais, alguns números.

Esta noite não teve grandes vencedores. Cavaco ganhou, aumentou a percentagem, mas perdeu 500 mil votos. Aliás, só nas legislativas em 1985 teve o actual Presidente menos votos do que hoje.

Também Fernando Nobre foi considerado um vencedor. De facto teve um resultado muito digno, mas não vale a pena fingir que se tratava de uma figura apolítica. Nobre é um candidato criado por Soares para tirar votos a Alegre. Aliás, não deixa de ser engraçado reparar que Nobre só teve menos 0.2% pontos percentuais que Mário Soares em 2006 (embora tenha tido menos 190 mil votos).

Quanto a mim o grande derrotado desta noite, mais do que Manuel Alegre, é o Bloco de Esquerda. Foi o BE que impôs a candidatura de Alegre ao PS. Alegre sem apoios partidários teve em 2006 mais 300 mil votos do que o hoje, e o Mário Soares em 2006 só teve menos 45 mil votos do que o candidato do BE e PS hoje.

Ou seja, na primeira vez que o BE apresenta um candidato sério nas eleições os seus eleitores desaparecem. Provou-se que o Bloco é apenas um partido de protesto e nunca um candidato ao poder.

Por fim a abstenção. Hoje votaram menos 1.644.519 pessoas do que em 2006. Menos 1.301.063 do que nas legislativas de 2009. Só nas eleições presidenciais de 2001 é que a abstenção tinha ultrapassado os 50%. Mesmo assim, nessas eleições votaram mais 638.621 pessoas. Hoje houve mais 131.523 votos em branco (na prática os votos em branco ficara em 5º lugar nestas eleições) do que em 2006 e mais 43.394 votos nulos (mais do que duplicaram).

Estes números deixam a nu um facto: o total desinteresse das pessoas nestas eleições. Os candidatos eram tão indiferentes, que para a maior parte da população era tanto fazia quem ganhava.

Para além disso, olhando para os menos 500.000 de Cavaco, assim como para a abstenção e sobretudo para os votos nulos e em branco é impossível não pensar em todos aqueles que em 2006 viram em Cavaco a última esperança contra o progressismo do Governo de Sócrates e que passados cinco anos se recusaram a votar nele. No fim, não fez diferença, mas fica o aviso a todos os católicos políticos que não podem dar o voto católico por adquirido.

segunda-feira, janeiro 10, 2011

O Presidente Institucionalizado

“Um presidente que actue exclusivamente com base nas suas convicções filosóficas e religiosas é um mau presidente, porque não cumpre uma função fundamental que a Constituição lhe atribui, que é garantir a unidade do Estado”. Com esta frase justificou o Presidente da República o facto de não ter vetado a lei que equipara a união de duas pessoas do mesmo sexo ao casamento.

Com esta afirmação demonstra o Professor Cavaco Silva duas coisas:

- Pelos visto não percebe que a o casamento entre pessoas do mesmo sexo não é uma questão meramente filosófica ou religiosa. É antes de mais uma questão cultural: permitir que dois homens se casem é reduzir o casamento a um mero reconhecimento público da afeição entre duas pessoas. Ora não é para isto que o casamento serve, para proteger a família que se funda quando um homem e uma mulher se unem com o fim de constituir família. Esta nova lei destrói o casamento, ataca por isso a família e a protecção que a sociedade lhe concede.

- Para além disso o Presidente parece não perceber bem a natureza do cargo que ocupa. Quando votamos nas eleições presidenciais não votamos num partido ou numa ideologia, mas numa pessoa. Votamos no homem que achamos que pelas suas capacidades e ideais está mais apto a desempenhar o papel de Presidente da República. Não agir conforme aquilo que publicamente testemunha é ir contra o voto de quem o elegeu. Não há dois Cavaco Silvas: um que beija a mão ao Santo Padre e outro que promulga a lei do casamento entre pessoas do mesmo sexo. O actual presidente deixou claro com esta resposta qual dos dois é.

É sobretudo esta a segunda razão que me vai levar a provavelmente votar em branco nas próximas eleições. Não vale a pena dar o meu voto a um homem que esconde a sua humanidade e age como uma instituição.

Inquisição em Portugal

"O pedido [estabelecimento da Inquisição] de El-Rei de Portugal [Dom João III] não podia ser bem recebido na cúria, onde acerca dos judeus havia ideias e normas de tolerância absolutamente diferentes daquelas que geralmente vogavam aquém Pirenéus; e nem facilmente se esqueceria em Roma, que mais de uma vez os papas se viram obrigados a protestar contra os abusos cometidos em Castela à sombra do Santo Ofício.

(...)

Até El-Rei chegava a notícia, transmitida pelos magistrados de que em diversos pontos a cólera popular ameaçava desafogar-se em excessos de violência. (...) Para compreender a resolução de Dom João III, bastará supor-lhe a intenção, aliás bem justificada, de pôr termo aos conflitos entre as justiças seculares e as eclesiásticas, e de desarmar as iras do povo contra os judeus, instituindo uma jurisdição, a do Santo Ofício, a quem exclusivamente ficava pertencendo a competência em matéria de heresia.

(...)

Lourenço Pucci, Cardeal Santiquatro, uma das personagens mais influentes na cúria, a quem Brás Neto deu conhecimento da pretensão para alcançar dele favor em ordem ao deferimento, mostrou grande repugnância em patrocinar semelhante negócio. Entedia que se tratava apenas de espoliar a gente hebreia das suas riquezas, a pretexto de heresia, como em Castela se praticava, segundo voz corrente. Pela sua parte era de opinião que se desse liberdade aos cristãos-novos para voltarem à sua crença antiga, punindo-se rigorosamente os que preferissem ficar no grémio do cristianismo se delinquíssem contra a fé."

cf. FORTUNATO DE ALMEIDA, História de Portugal - Desde os Tempos Pré-Hitóricos a 1580, págs. 388 a 390, BERTRAND EDITORA, 2003, Lisboa.

A Inquisição portuguesa, assim como a Inquisição espanhola, nasceram contra a vontade do Papa, por pressões e ameaças. Desde de sempre foram controladas pelo poder real e usadas por este para atingir os seus fins, que nem sempre coincidiam com os da Igreja.

Nos nossos dias a Inquisição virou um mito e uma arma de arremesso contra a Igreja, totalmente desproporcional aos factos históricos. Ao contrário do que o mito faz acreditar a Inquisição não só era geralmente muito mais branda do que os tribunais civis, como era também um tribunal muito mais competente e honesto.

Claro que houve abusos, muitos dos quais praticado por clérigos. Mas a maior parte destes abusos não se deveu a fanatismos religiosas, mas a inveja e cobiça.

É importante estudar os factos em fez de nos deixarmos cegar pela ideologia.

sexta-feira, janeiro 07, 2011

Catolicismo e Revolução Francesa - Padre João Seabra

A tomada da Bastilha está a ser comemorada em França com um convénio sobre “Imagens da Revolução”, que suponho proporá as do costume: a Revolução como triunfo da razão sobre o obscurantismo, e como triunfo da liberdade sobre a opressão. Quem propõe imagens não está, normalmente, interessado nos factos: quer manter funcionais os mitos e os símbolos do imaginário colectivo. Ora eu proponho-me escrever sobre factos. Alguns, claro: não falo de muitos outros, também importantes. Mas aqueles de que falo são factos reais, e sem os conhecer não se compreende a Revolução Francesa.


Igreja e Revolução; ideias comuns, factos reais

As simplificações dos manuais escolares e da cultura mediática são conhecidas: a Igreja era aliada do Antigo Regime e identificava-se com ele; opôs-se à Revolução e combateu os novos ideais; só tardiamente se juntou à causa da democracia e da liberdade, reconhecendo na trilogia “Igualdade, Liberdade, Fraternidade” uma reformulação actualizada do Evangelho. O Dr. Raul Rego e monsenhor Lefebvre estão de acordo em afirmar que, no Vaticano II, a Igreja aderiu à Revolução Francesa, embora esse facto os impressione de maneira diversa.

Observados de perto, porém, os factos adaptam-se mal às generalizações. Os “Cahiers de Doléances”, cujo estudo é fundamental para conhecer o estado de espírito e as reivindicações populares que serviram de base às transformações sociais subsequentes, não contêm elementos de luta anti-religiosa. O clero apoiou de maneira larga as reclamações do Terceiro Estado e, nos primeiros tempos da Revolução, inseriu-se na onda patriótica, benzendo as bandeiras da Guarda Nacional. Mesmo o “pôr à disposição da Nação” dos bens eclesiásticos, com a abolição dos direitos feudais a quatro de Agosto de 1789, não foi vivido como um momento de luta anti-religiosa: a Assembleia legislou imediatamente sobre a manutenção do clero. E a primeira festa da Revolução, 14 de Julho de 1790, foi uma missa campal, concelebrada no Campo de Marte, diante dos representantes dos departamentos, por trezentos sacerdotes, entre os quais o pároco de Saint-Sulpice, Monsieur de Paucemont, que será dentro em breve o chefe dos “refractários”. Claro que há divisões no clero – mas são políticas, e assumidas como tal. Um ano depois da tomada da Bastilha, não há nenhuma frente séria de conflito entre a Igreja e a Assembleia.


Constituição Civil, Igreja nacional, perseguição religiosa

Mas dois dias antes, a 12 de Julho de 1790, fora publicada a Constituição Civil do Clero: ora esta é uma lei anticatólica, de galicanismo extremo. O Papa não é sequer mencionado: a Igreja é definida legislativamente como uma igreja nacional, inteiramente submetida ao poder do Estado. Todos os bispos e padres a têm de jurar, sem o que ficam impedidos de exercer o ministério.
É assim que começa a luta da Revolução contra a Igreja. Esta luta não corresponde a nenhum movimento popular nem a nenhuma necessidade política. Corresponde à vitória de um grupo influente de clérigos anti-romanos, jansenistas e galicanos, que se apoiam no jacobinismo mais radicalmente anticristão para fazerem o que julgam ser uma reforma da Igreja: porque em todas as épocas se encontra sempre uma vanguarda da Igreja disposta a ser a retaguarda da História.

A fidelidade ao Papa, do clero e dos fiéis, que os legisladores não esperavam, criou uma crise de dimensões profundíssimas, cuja influência no futuro da Revolução, até ao bonapartismo e, finalmente, à restauração, foi imensa. Em Março de 1791 o Papa proibiu o juramento da Constituição Civil, pelo breve Quod Aliquantum. Só quatro bispos a aceitaram e, talvez, metade dos padres, embora muitos se retractassem depois da proibição papal. Os “ajuramentados” são maioritariamente rejeitados pelos fiéis; mas os “refractários”, que recusam jurar a lei, não podem exercer o culto e ficam vagas oitenta dioceses, mais de 20.000 paróquias. O clero refractário é sucessivamente destituído, condenado à deportação pela Assembleia Legislativa a 26 de Agosto de 1792, e à morte pela Convenção a 18 de Março de 1793. Entre 30.000 a 40.000 padres abandonam a França, quase 3.000 são guilhotinados. Os massacres de Setembro de 1792 fazem centenas de vítimas entre sacerdotes e religiosos.

A luta religiosa radicaliza a Revolução. Apenas um exemplo: a fuga de Luís XVI, terminada em Varennes, levando ao processo e morte do rei, dividiu irremediavelmente a França em dois blocos inconciliáveis; mas parece ter-se por documentalmente assente que a razão determinante da fuga do rei foi o terem-no obrigado, em Abril de 1791, a receber a comunhão pascal de um padre ajuramentado, pois o rei estava disposto a abdicar do poder absoluto mas não a viver contra a sua fé.


O genocídio franco-francês

Em 1793 começa a guerra da Vendeia. A chouannerie, antes que monárquica é católica, como diz um camponês angevino ao juiz Clémenceau: “Je ne demandons point de roi. Mais je voulons nos bons prêtres”. É a recusa das consciências de aderir à religião do Estado, o direito de prestar culto a Deus de acordo com as próprias convicções que os chouans defendem. Para os vencer, é preciso “incendiar tudo”, como diz Tourreau, general-chefe do Exército do Oeste, em carta ao Comité de Salut Publique de 17 de Janeiro de 1794. E a 11 de Fevereiro o comité dá a ordem: “Écrasez totalement cette horrible Vendée”. É a hora das Colunas Infernais, que recebem do general Grignon a proclamação demencial: “Entregar às chamas tudo o que puder ser queimado, e passar ao fio da baioneta todos os habitantes. Bem sei que pode haver alguns patriotas nesta região: é igual, devemos sacrificar tudo”.

O “carniceiro de Vendeia”, Westermann, escreve a 23 de Dezembro de 1793: “Fizemos uma carnificina (boucherie) horrível. Já não há Vendeia: exterminei tudo. Deixámos de fazer prisioneiros: a piedade não é revolucionária”.

Não se trata dos excessos habituais da soldadesca. É a minuciosa execução, se ouso dizer a palavra, dos decretos da Convenção de 1 de Agosto e de 14 de Outubro de 1793: “Enviar um exército incendiário, de modo a que nenhum homem nem nenhum animal possa subsistir sobre esse solo”. Do horrível massacre, que dura quase um ano, recordemos apenas uma data: 28 de Fevereiro de 1794, quando na Igreja des Lucs os exércitos da Convenção chacinaram até à última 110 crianças com menos de oito anos de idade.


A revolução contra o catolicismo

Daí em diante, até ao fim do século, a Revolução fará do catolicismo fiel ao Papa o seu inimigo principal. Até Roma levarão a guerra os exércitos franceses. Pio VI morre desterrado e prisioneiro de França. A concordata que um humilhado e heróico Pio VII celebrará, e a que Napoleão juntará os “Artigos Orgânicos”, colocará a Igreja francesa numa sujeição ao Estado de que levará um século a libertar-se. O esforço por criar, primeiro uma Igreja nacional, depois uma religião laica, com o culto do Ser Supremo e da Deusa Razão, ocupará grande parte das energias da Convenção, dos furores de Fouquier-Tinville, e a lâmina da guilhotina.


Revolução francesa e liberal

Até aqui, os factos de que prometi falar: documentos, nomes, datas – maçadas que todos deviam saber, se a História consistisse humildemente em contar o que sabemos do passado, em vez de ser, como normalmente é, inventar uma genealogia às opções do historiador que a escreve ou do imperador que a estipendia.

Mas depois de contar os factos, vou ousar também três comentários – para que ao menos a mim interesse alguma coisa do que escrevo...

Primeiro. A Revolução estabeleceu legislativamente uma Igreja nacional. Ora isto nada tem a ver com a liberdade: reencontramos essa tentativa no Kulturkampf, de Bismark, no cristianismo alemão de Hitler, na Igreja patriótica de Mao-Tsé-Tung, na Igreja popular dos sandinistas. Ao bater-se contra esta prepotência, a Igreja Católica bate-se pela liberdade de consciência, pelo direito de qualquer homem prestar culto a Deus segundo as suas convicções. A Revolução Francesa, com a Constituição Civil do Clero, estabeleceu-se como a raiz de todos os totalitarismos modernos.

Segundo. A guerra de Vendeia é o primeiro exemplo de guerra total que conhecemos, pelo menos desde que Dario derrotou o império assírio. Os campos de extermínio nazis, a destruição dos arménios, o genocídio do Camboja, são herdeiros das instruções da Convenção ao Exército do Oeste. Porque Pol Pot não é um sátrapa oriental, como gostamos de pensar: é um ideólogo que fez o Maio de 68 em Paris como jovem estudante e aprendeu o desrespeito da pessoa humana na escola onde ele melhor se ensina: na descristianização da cultura ocidental. A Revolução Francesa, com a Guerra da Vendeia, estabeleceu-se como modelo de todos os genocídios contemporâneos.

Terceiro. A Declaração Universal dos Direitos do Homem, a Declaração sobre a Liberdade Religiosa Dignitatis Humanae do Concílio Vaticano II, os Pactos Internacionais de Direitos Humanos, a Acta Final de Helsínquia, devem mais ao breve Quod Aliquantum de Pio VI, ao clero refractário, aos camponeses humildes da Vendeia e a Monsieur de Charette, do que à Revolução Francesa. O que a Revolução quis foi sacralizar o Estado, e para isso tentou destruir o cristianismo. A defesa da integridade do catolicismo representou, então como sempre, a fronteira da dignidade da pessoa humana.

E termino. Nos dez anos que vão de 1792 à Concordata de 1802, a Igreja Católica foi privada de todos os seus bens, de estatuto jurídico, da possibilidade de expressão pública, de qualquer forma visível de organização; viu destruídos centros de irradiação intelectual e espiritual, dispersas ou queimadas bibliotecas e acervos culturais seculares, profanados templos e conventos. Perdeu tudo. Mas ganhou aquilo com que se constrói, desde o princípio: mártires, milhares de mártires. Não é o menor dos grandes serviços prestados à causa da liberdade pelo Papa João Paulo II o ter ousado, contra os diktats da cultura dominante, mandar reabrir os processos de canonização dos mártires da fé que fez a Revolução Francesa.

Artigo publicado n’O Independente, 14 de Julho de 1989

quinta-feira, janeiro 06, 2011

Acabemos com a Escola Pública.

O Governo aprovou um Decreto-Lei onde diminui o apoio as escolas privadas com contrato de associação. Para além disso, com esta nova lei, os contratos de associação deixam de ser automaticamente renovados para serem discutidos plurianualmente.

Para perceber bem esta questão parece-me que é preciso recuar uns passos. Tendencialmente quando se discute o financiamento das escolas privadas a primeira coisa que ouvimos é “quem quer ter os filhos em colégios que pague”. Como se de alguma maneira os pais não tivessem o direito a escolher o modo como educam os filhos.

Ora, a Constituição não só concede o direito como impõe a obrigação aos pais de educarem os seus filhos (CRP art. 36º/5). Este direito/dever é depois desenvolvido no artigo 1878º/1 do Código Civil que diz que os pais devem dirigir a educação dos filhos. Para além disso a Constituição garante a protecção do Estado e da sociedade aos pais na realização da sua insubstituível missão (CRP art. 68º/1).

Por isso se é aos pais que cabe educar os filhos, então estes devem poder educa-los da maneira que acharem melhor. Podem ensinar as crianças a ser honestas ou a ser gananciosas; podem educa-las na fé ou então na ausência da religião; podem ser rígidos ou mima-los: desde que respeitem os direitos das crianças podem e devem educa-las o melhor souberem.

Contudo existe uma parte da educação dos filhos que os pais não podem proporcionar: a formação académica. Aqui de facto é preciso o apoio da sociedade e do Estado, tal como previsto na Constituição. O Legislador Constituinte achou que a maneira de suprir esta necessidade era a criação de um rede de escolas públicas criada pelo Estado (CRP art. 75º/1).

Por causa deste artigo criou-se em Portugal um sistema educativo totalmente estatalista, onde a contratação das contínuas depende da Direcção Regional de Educação e a dos professores do Ministério da Educação. O Estado garante o ensino público, não confessional, não ideológico, mas onde a autoridade dos pais não entra. Os pais não têm nada a dizer no que toca aos currículos, às disciplinas que a criança tem, aos professores ou a direcção da escola. Tudo depende do Ministério da Educação ou das Direcções Regionais nomeadas pelo Ministro.

Claro que este ensino não ideológico é mera ficção. Não se pode ensinar sem tomar posição sobre os assuntos. Se o Ministério decide pôr no currículo Descartes e não pôr São Tomás ou se o professor decide dar Eugénio de Andrade e não dar José Régio estão a tomar uma posição ideológica.

A única alternativa que os pais têm a submeter os filhos ao modelo educativo do Ministério da Educação é pô-los em escolas privadas. O problema é que estas custam dinheiro porque não são custeadas pelo Estado.

E aqui chegamos ao dilema da questão: os pais tem o dever de educar os filhos, o Estado consagra o direito de o fazerem em liberdade, mas no que toca a formação académica só os ricos são realmente livres.

Escolher a escola onde se põem os filhos não é um luxo, mas um direito. Nós estamos de tal maneira imbuídos na maneira de pensar socialista que nos esquecemos disto: o escândalo não é que o Estado financie escolas privadas, o escândalo é que o Estado não as financie totalmente.

O dever do Estado é garantir que os pais possam educar os filhos em liberdade. A maneira de garantir isto é tornando rede escola estatal supletiva e financiando totalmente as escolas das comunidades que se organizarem.