O Senhor dos Anéis
é sem dúvida o meu livro preferido. Desde a primeira vez que o li, há 16 anos,
todos os anos o volto a ler. E de cada vez descubro uma coisa nova. Um pormenor
ou uma situação de que ainda não tinha dado conta.
O que me fascina em O
Senhor dos Anéis é o seu profundo cristianismo. É verdade que não há
nenhuma referência a Deus no livro. De facto Tolkien fez questão de suprimir
qualquer menção religiosa da obra. E contudo, ainda não encontrei nenhum
romance tão cristão como este.
Tolkien considerava que os mitos eram reflexos da Verdade.
Eram aquilo que o homem era capaz de compreender da realidade sem a revelação.
De facto, para Tolkien, a história da Revelação era um mito como os outros, com
a diferença substancial de que era Verdade.
Por isso O Senhor dos
Anéis é um mito. Mas um mito escrito por um cristão. Um mito escrito por
homem que ia a missa diariamente, que fazia adoração ao Santíssimo diariamente,
que se confessava semanalmente. Um homem para quem a sua vida, e a sua obra,
eram inseparáveis da sua fé.
E por isso ler O
Senhor dos Anéis é ler um livro de aventuras, mas que parte de um juízo cristão
sobre a realidade. Tolkien não procura reescrever a história da Revelação, nem
tão pouco fazer uma analogia como Lewis nas Crónicas de Narnia.
Tolkien quer apenas contar uma história. Mas uma história
que parte da sua humanidade. Por isso nos fala da luta entre o bem e o mal. Mas
não a luta entre o bem e o mal abstracto, mas a luta que se trava dentro no
coração de cada homem. Por isso nos fala do pecado, mas também da misericórdia
e do arrependimento. Por isso nos fala da heroicidade, mas também de como só o
Desígnio daquele que é ainda mais poderoso do que Sauron pode salvar a Terra.
Nada disto é propositado (como o próprio afirma). A obra não
é católica porque Tolkien a pensou de forma católica. Não é uma obra de
apologia cristã. O Senhor dos Anéis é
católico porque Tolkien o é. E por isso para ele é evidente a tentação, é
evidente o limite do homem e é evidente que só Deus pode salvar a humanidade
ferida.
E isto para ele é tão verdade na sua vida, como no mundo que
ele imaginou. Por isso vale a pena ler O
Senhor dos Anéis. Não procurando significados ocultos ou comparações
fantasiosas. Nem Frodo nem Gandalf são Jesus e Galadriel não é Nossa Senhora. A
grandeza deste livro é ser possível reconhecer nele um homem que vive a toda a
sua vida, incluindo a sua escrita, diante do Mistério de Deus.
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